Era o final do meu terceiro dia em Montevideo. Depois de uma tarde abrasadora, passada metade em livrarias e metade em um simpósio, eu e uns colegas nos preparamos para percorrer a Avenida 18 de Julio, rumo à Ciudad Vieja. Nosso destino: a confraternização final do congresso. Nada mais prosaico, para quem costuma ir a esses eventos.
Acontece que, pela avenida, ia a manifestação do dia internacional de combate à violência contra a mulher.
Como se pode supor, houve atos no mundo todo. Ali, porém, a coisa parecia diferente. Talvez porque estivesse passando ao meu lado. Bem mais de mil pessoas, talvez o dobro, vestidas de negro. Em silêncio.
À frente, mulheres carregavam velas e cruzes púrpuras onde estavam escritos os nomes de suas mães, suas filhas, suas irmãs, suas amigas que haviam morrido vítimas da violência dos homens. Naquela que é uma das avenidas mais movimentadas da capital, ouvia-se apenas o som de milhares de passos.
Eu olhava aparvalhado quando meus colegas me chamaram para dentro. Já iam com a multidão. E me deixei ir. Fui olhando o rosto das pessoas, casais, velhos, crianças. Chegamos à praça. Fez-se um ato silencioso. Um silêncio de milhares.
Uma coisa é estar em um país estrangeiro e meter-se em algo assim pela atração do exótico. Quase como um programa turístico para quem não quer se parecer com o turista convencional. Comigo não foi assim. Foi espontâneo e surpreendente. Me vi no meio daquela gente, lendo os nomes das mulheres nas cruzes. Relendo. Mirando os olhos das mulheres que as carregavam.
O silêncio sempre diz muito. O som dos passos conta mais que o som das palavras. Sonho com o dia em que apenas caminhar seja necessário.
ResponderExcluirQue protesto inteligente. O silêncio pode ser tão carregado de significados. Deve ter sido de arrepiar. Ainda mais em Montevideo, uma cidade que vibra diferente (coisa minha, mas que muita gente também sente!)
ResponderExcluirAcompanhei muitas manifestações alertando contra a violência da mulher, no Brasil e em outros lugares, na internet e no "mundo real". Que assim siga!
Nas palavras do Galeano (sempre ele, com razão):
La violencia contra la mujer es el miedo del hombre de la mujer sin miedo.
Abraço grande!